28 de abr. de 2009

Texto 1

Tempo nublado nos meus olhos que ardem, mar desertificado na ausência de consangüinidade com os dias. Fui exaurido na busca eterna de coisas místicas, confundindo mitos e lendas com a realidade, muitas vezes insuportável, dos meus ainda poucos anos vividos. Exaspera-me não ter como mensurar exatamente em que ponto da vida estou: sou jovem ainda para ter alcançado imaterialidades tais como sabedoria e calma diante da vida (penso: "é preciso ter sofrido muito e sobrevivido a tudo com um mínimo de sanidade"); entretanto já sou muito velho para outros comportamentos pouco condizentes com a minha condição de jovem já envelhecendo. Desespero-me diante das dificuldades mínimas da vida e dos meus medos adolescentes subitamente renascidos. À medida que envelheço descubro meus distúrbios da puberdade e pondero se realmente deixamos de ser adolescentes diante do dia a dia e das experiências. Sinto-me antigo como um grão de areia agregado à rocha; como a primeira partícula de poeira surgida no Big Bang. Minhas idéias andam em sentido oposto ao do meu corpo. Sou um guardador de tesouros antigos, que já não interessam mais a ninguém. Não há mais quem queira saber o que há guardado entre as milenares juntas doloridas de meus ossos. Por isso me sufoco na poeira secular dos meus alfarrábios, todos escritos no antigo idioma da afetividade humana, quando não existiam as variantes distorcidas por religiosidades torpes, belicosidades sócio-políticas ou excrescências filosóficas mal digeridas no passar dos séculos. Era tudo simples no instante em que vejo, em meio a essa atmosfera Pessoana, sentindo ânsia pela vida como se fosse morrer neste próximo segundo. Desoriento-me. Não há bússolas, astrolábios, mapas, nada que me guie. Não tenho norte porque desaprendi a ler estrelas e meu eremitério é, hoje, fraca fortaleza urbana, de onde não consigo mais vislumbrar o conhecimento, a não ser para mascateá-lo em nome da sobrevivência. Tenho uma tristeza cansada, que não é infelicidade, de quem tenta ser feliz todos os dias com otimismo, mas que acaba sendo vencido pelo rosto marcado no espelho ao fim do dia, e que se contenta com o calor do próprio corpo repetido no colchão. Tempo nublado nos meus olhos que ardem, não por chorar, pois desaprendi a arte do extravasamento das emoções. É meu corpo que paga pelas agruras do dia a dia e pelo meu revoltante silêncio. Meus olhos ardem porque já não podem mais contemplar o mundo em sua plenitude; por não mais olhar no olhar do outro, pois ambos não nos permitimos, animais acuados diante do desejo de serem plenos, mas com medo. Então me pergunto se ainda poderei transformar este desejo em energia prometéica que nos conduza novamente ao Avalon de nossa plenitude.

Flávio Moreira
12AGO92

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