20 de jan. de 2010

Sem título

(da série de textos perdidos)

E já, então, cansado e triste, sento-me à mesa da neutralidade, a me esconder sob este manto roto que é a poesia, tentativa inútil de extravasar-me definitivamente nos desvãos da "city", dissolvendo-me sujo em vapores lodosos de neon. Quisera não sentir tanto e tão profundamente, não exercendo jamais este fascínio sobre as gentes, pois sempre ele vem acompanhado de um temor, de uma repulsa, e eu nunca sei direito que
sensação inspiro. Mas não posso coisa alguma fazer, pois tenho os olhos faiscantes de lágrimas ferventes, que meu coração batido expele de transbordo, como a querer gritar do fundo alagado do meu peito a exumação da culpa que não me pertence: que posso fazer se sinto no fluxo e refluxo de sangue do meu corpo o oscilar constante da insanidade do mundo, que ama e odeia com fúria e mansidão, ou se percebo passando por minha alma, minha mente, minha união toda de corpo e espírito, as emoções correntes como enxurradas? Afinal, que culpa é esta que possuo por ser "humano"?

(09/05/1989 - A propósito de Augusto dos Anjos)

Um comentário:

  1. Belo pela sinceridade!
    Nos atrai porque nos sentimos cúmplices e participantes dos mesmos sentimentos!

    Muito lindo!

    Abraços!

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