20 de jan. de 2010

Quase 30

(da série de textos perdidos)

São Paulo, 29 de abril de 1999.
"Parce que moi je rêve
Moi je ne le suis pas"
Quase 30.
Estou sentado diante do computador - esta ferramenta moderna que supostamente deveria facilitar a vida dos homens mas que cada vez mais os afasta de si mesmos -, olhando esta letra "bonitinha" que se desenha sobre a tela enquanto bato sem agilidade nas teclas...

Quase 30.
Estou com um pouco de sono, com muita fome, algum cansaço... Não tirei os sapatos ainda. Está frio e os meus pés nos sapatos estão quentinhos. Está frio e eu estou só de camiseta. Visto, ainda, essa calça jeans de que não gosto, mas que é resistente, que está suja, que neste momento mantém a temperatura das minhas pernas em um nível saudável. Meio vestido. Um pouco desvestido. A sensação da roupa no corpo, a proteção, o calor morno, a brisa fria nos cotovelos... Minhas mãos mornas...

Quase 30.
A música repetido, intencionalmente, no toca discos a laser. "Someday in my life". "Algum dia em minha vida". Algum dia em minha vida minhas lembranças apagadas da noite de 29 de abril, um pouco fria, em que escrevi este texto. O sono, a fome, o cansaço, o frio, o morno, a música, a repetição. Que lembranças serão? O amor esquecido, a passagem do tempo, as areias de minha alma escorrendo pela lisa, fria e brilhante superfície da vida, a sabedoria de não saber mais nada, a não ser o essencial, o incógnito, o que está lá, algum dia em minha vida, e não aqui, neste dia em minha vida...

Quase 30.
Daqui a seis, não, cinco minutos. Uma manhã após uma noite de luar. "Um espetáculo", ouvi do amigo ao apontar-lhe o lume daquela bola no céu, com algumas delicadas nuvens fazendo-lhe moldura sutil como quimera. Sim, espetáculo. Palidez feita de luz um brilho pérola tudo em volta aquático o som apenas uma imagem instantânea para cá das estrelas...

Quase 30.
Um minuto apenas e não haverá mais este hoje. Pronto, o amanhã chegou sem amanhecer seu calor dourado, ainda fingindo ser aquele ontem de um minuto atrás. Amores diluindo-se entre ontem e amanhã, hoje...

Já é 30.
E o meu dia está apenas começando. Agora vou aos sonhos, meus sonhos, meu mundo de sonhos, por que eu sonho...

Boa noite. Bom dia.
(29-30/04/1999)

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